Só as multidões indignadas conseguirão envelhecer o discurso de Jefferson Péres
Gravado em 30 de agosto de 2006, o vídeo de sete minutos que ilustra o post publicado em 23 de novembro de 2010 com o título A falta que fazem os homens honrados
registrou o profundo desalento do senador Jefferson Péres, do PDT
amazonense, com o deserto político brasileiro. Passados sete anos, a
perturbadora atualidade do discurso ajuda a compreender a revolta da
rua. E reforça a sensação de que as palavras pronunciadas por um
parlamentar exemplarmente íntegro só ficarão grisalhas quando as
multidões indignadas resolverem dissolver nas urnas o clube dos
cafajestes que domina o país.
Confira o texto reproduzido abaixo:
“Volto a este microfone para manifestar meu desalento com a vida
pública deste país”, avisou o senador Jefferson Péres na tarde de 30 de
agosto de 2006. Nos sete minutos seguintes, sem minuetos retóricos, sem
quaisquer truques de tribuno, o parlamentar do PDT amazonense limitou-se
a contemplar a paisagem do inverno eleitoral com o olhar desconsolado
de um homem de bem. A plateia diminuta pressentiu que testemunhava um
momento histórico. Mas ninguém poderia saber que ouvia o testamento
político de Jefferson Péres, morto em maio de 2008 aos 76 anos.
“Não quero mais viver a vida pública”, decidira. Até 2010,
seguiria entrincheirado na tribuna, combatendo o presidente então em
campanha pela reeleição. Encerrado o mandato, pretendia “continuar
pelejando por todos os meios possíveis”, mas longe do coração do poder.
Não queria permanecer no cenário do mensalão, “um dos piores escândalos
de corrupção deste país”, planejado e concluído com a conivência do
presidente da República. Lula sabia de tudo, constatou.
O áudio é uma aula sobre como fazer oposição sem ambiguidades.
Pouco importava que Lula fosse vitorioso “com 99,9% dos votos”,
ressalvou. “Estarei na tribuna dizendo que ele devia ser destituído,
porque o que fez foi muito grave”. Também se recusava a ajustar seu
comportamento aos desígnios da maioria. “Podem chamar até o Fernandinho
Beira-Mar e fazê-lo presidente”, ironizou. Que não contassem com ele.
Sincero, corajoso, Péres desancou o Executivo e o Legislativo com
igual inclemência, mas observou que “a crise ética não é só da classe
política, é de grande parte da população”. Indignado com a subserviência
de artistas e intelectuais governistas, qualificou de “cínicas e
desavergonhadas” as declarações do grupo de abreus e bettis que havia
reverenciado Lula, dias antes, na casa de Gilberto Gil.
Se estivesse vivo, o senador não veria uma paisagem muito melhor.
Mas certamente o animaria a certeza de que a solidão acabou.
Concordariam com homens como Jefferson Péres os milhões de brasileiros
que lutam pelo fim da Era da Mediocridade mas não se sentem
representados pela oposição oficial.
Coluna de Augusto Nunes
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