Senadores analisam requerimento de urgência para votar o projeto do Marco Civil da Internet, em Brasília
(Waldemir Barreto/Agência Senado)
Projeto de lei que estabelece regras de uso da rede é aprovado às pressas na véspera de encontro mundial que acontece no Brasil
Após três anos de tramitação no Congresso Nacional, o Senado
aprovou nesta terça-feira, em votação simbólica, o projeto de lei que
regulamenta a web brasileira. O Marco Civil da Internet estabelece
direitos e deveres de cidadãos, provedores e governo no ambiente virtual
e foi aprovado às vésperas do Encontro Multissetorial Global sobre o
Futuro da Governança da Internet, evento que reunirá autoridades de todo
o mundo nesta quarta e quinta-feira, em São Paulo. O texto segue para a
sanção da presidente Dilma Rousseff.
Enquanto na Câmara o Marco Civil passou por uma série de discussões e
teve o texto alterado após pressão de deputados, no Senado a matéria
tramitou a toque de caixa: foi aprovada sem debates por duas comissões
nesta manhã e levada ao plenário após uma manobra de senadores
governistas que garantiu que o tema fosse colocado como o primeiro item
da pauta. Não houve alterações ao texto da Câmara.
O que vai mudar com o Marco Civil da internet
Neutralidade de rede
Como é hoje
É estabelecida por uma resolução da Anatel, que pode ser facilmente revogada
É estabelecida por uma resolução da Anatel, que pode ser facilmente revogada
Como vai ficar
Provedores de conexão à web (Oi, Vivo, Net etc.) deverão dar o mesmo tratamento a todos os pacotes de dados que trafegam pela rede, não importanto conteúdo, origem ou destino
Provedores de conexão à web (Oi, Vivo, Net etc.) deverão dar o mesmo tratamento a todos os pacotes de dados que trafegam pela rede, não importanto conteúdo, origem ou destino
Exclusão de dados do usuário por serviços web
Como é hoje
Não há norma disciplinando a questão
Não há norma disciplinando a questão
Como vai ficar
Provedores de serviços (Google, Facebook, Netflix etc.)
deverão excluir definitivamente dados do usuário quando este encerra sua conta
Provedores de serviços (Google, Facebook, Netflix etc.)
deverão excluir definitivamente dados do usuário quando este encerra sua conta
Responsabilidade por conteúdos publicados
Como é hoje
Provedores de aplicações (Google, Facebook, Instagram etc.) podem ser responsabilizados civilmente por conteúdos publicados em seus serviços por terceiros
Provedores de aplicações (Google, Facebook, Instagram etc.) podem ser responsabilizados civilmente por conteúdos publicados em seus serviços por terceiros
Como vai ficar
Os provedores de aplicação só serão responsabilizados civilmente pelo conteúdo de terceiros se, após ordem judicial, se recusarem a retirar do ar o conteúdo em questão
Os provedores de aplicação só serão responsabilizados civilmente pelo conteúdo de terceiros se, após ordem judicial, se recusarem a retirar do ar o conteúdo em questão
Guarda de dados de conexão
Como é hoje
Acordo entre o Comitê Gestor de Internet (CGI.br) e provedores de conexão à rede prevê a guarda de dados por três anos
Acordo entre o Comitê Gestor de Internet (CGI.br) e provedores de conexão à rede prevê a guarda de dados por três anos
Como vai ficar
Os provedores de conexão deverão manter os registros de acesso do usuário por um ano
Os provedores de conexão deverão manter os registros de acesso do usuário por um ano
Guarda dos registros de navegação de usuários
Como é hoje
Tanto os provedores de conexão (Oi, Vivo, GVT, Net) quanto os de aplicação (Google, Facebook, Netflix etc.) podem guardar registros de navegação pelo prazo de três anos
Tanto os provedores de conexão (Oi, Vivo, GVT, Net) quanto os de aplicação (Google, Facebook, Netflix etc.) podem guardar registros de navegação pelo prazo de três anos
Como vai ficar
Os provedores de conexão à internet serão proibidos de armazenar registros que permitam saber quais sites foram acessados pelos usuários e quando. Provedores de aplicação (Google, Facebook, Netflix etc.) podem guardar tais dados desde que não repassem as informações a terceiros
Os provedores de conexão à internet serão proibidos de armazenar registros que permitam saber quais sites foram acessados pelos usuários e quando. Provedores de aplicação (Google, Facebook, Netflix etc.) podem guardar tais dados desde que não repassem as informações a terceiros
A agilidade dos senadores atende a apelo do Palácio do Planalto, que,
após as denúncias de espionagem norte-americana, não quis chegar de
mãos vazias no evento sobre governança da web. A presidente Dilma,
acompanhada pelo ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, participará
da cerimônia de abertura.
Com a aprovação do projeto, o usuário brasileiro de internet sai
beneficiado. Foi assegurada a neutralidade de rede, um dos grandes nós
da disputa em torno do Marco Civil e considerado pelo governo um dos
pontos mais caros do projeto. O dispositivo obriga os provedores de
conexão a tratar de maneira igual toda informação que trafega na rede,
sendo proibidas distinções em razão do tipo, origem ou destino dos
pacotes de dados. O princípio impede, por exemplo, que os donos da
infraestrutura da rede privilegiem alguns serviços (seus ou de terceiros
ou os que podem pagar mais) em detrimento de outros, minando a
concorrência e a inovação com uma espécie de pedágio discriminatório.
É a neutralidade, portanto, que pode assegurar que novos produtos
briguem com gigantes digitais estabelecidos sem serem prejudicados na
linha de largada. Com essa garantia, o melhor tem a maior chance de
vencer. A regulamentação da neutralidade dependerá de consulta prévia ao
Comitê Gestor da Internet (CGI) e à Anatel – inicialmente, a proposta
previa que a regulamentação se daria via simples decreto do Executivo,
mas o governo teve de ceder nesse ponto para viabilizar a votação.
Também terminou derrotada a proposta governista que queria obrigar
empresas estrangeiras que atuam no Brasil (caso de Facebook, Google e
Netflix, entre muitas outras) a instalar data centers para guardar dados
de usuários brasileiros. A ideia foi incorporada ao projeto no fim de
2013 – uma exigência da presidente Dilma Rousseff para dar uma "resposta
diplomática" à suspeita de espionagem de agências americanas a dados de
empresas e cidadãos brasileiros. A proposta — que não encontra paralelo
em nenhuma parte do mundo — foi duramente criticada por especialistas.
Além de desconsiderar a infraestrutura planetária da web, não teria o
resultado pretendido pelo Planalto: evitar a interceptação de dados
privados pelos espiões. Um efeito colateral, contudo, era certo: o
encarecimento de serviços locais.
O Marco Civil proíbe ainda que provedores de conexão à rede (empresas
como Oi, Vivo, GVT e NET) armazenem registros de navegação de usuário.
Por fim, entre as grandes disposições, o projeto de lei ordena
provedores de serviços web a excluir definitivamente dados do usuário
quando este encerra sua conta. Dessa forma, ficam protegidos fundamentos
essenciais ao florescimento contínuo da internet brasileira — como
concorrência, inovação, competitividade —, ao mesmo tempo em que o
usuário ganha maior proteção e privacidade no ambiente virtual.
A nova disposição sobre a guarda de dados de navegação do usuário é
outro acerto do Marco Civil. O texto proíbe que provedores de conexão à
internet armazenem registros que permitam saber quais sites foram
acessados pelos usuários e quando. Hoje, os usuários podem escolher se
circulam ou não pela web logados a sites como Google e Facebook,
fornecendo informações de navegação a eles. Eles não têm a mesma escolha
em relação aos provedores de conexão, daí a importância de estabelecer
limites para o uso que essas empresas podem fazer dos registros de
navegação dos seus clientes.
O texto aprovado nesta terça também traz disposições gerais sobre
importância da rede e os direitos dos usuários. É o caso dos artigos que
tratam da privacidade e liberdade de expressão. Apesar de terem
despertado a atenção do mundo nos últimos meses, em especial após a
divulgação das suspeitas de espionagem americana, esses temas já são
contemplados na Constituição Federal. Não há novidade, portanto.
O Marco Civil começou a ganhar forma em 2009, com o objetivo de
disciplinar o uso da rede, estabelecendo direitos e obrigações de seus
atores. Em 2011, a versão final foi apresentada ao Legislativo e passou a
ser discutida na Câmara. Representantes de empresas circularam pelos
bastidores do poder tentando influenciar os rumos da discussão.
Marcela Mattos, de Brasília
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