A imigração japonesa começou oficialmente no Brasil em 1908 quando chegaram ao nosso país os primeiros japoneses que desembarcaram no porto de Santos, em São Paulo, a bordo do navio "Kasatu Maru". Porém nessa mesma época, se tem registro da presença de outros imigrantes japoneses menos conhecidos vivendo no Norte do Brasil, na região Amazônica, e que ficaram conhecidos pelo nome de "PERU KUDARI".
Traduzindo do idioma japonês, o termo quer dizer "descidos do Peru", pois esses pioneiros japoneses que imigraram para a Amazônia Brasileira eram provenientes do Peru, se tornando eles um grupo específico no percurso da imigração nipônica.
Na verdade trata-se de uma parte da história da imigração japonesa no Brasil que ainda se tem pouco conhecimento.
O Peru foi o primeiro país latino-americano a receber imigrantes japoneses que chegaram ao país em 1899 a bordo do navio "Sakura Maru", num total de 790 pessoas que foram trazidos para trabalharem em fazendas de cana-de-açúcar e algodão do litoral peruano. Contudo 143 pessoas dessa primeira leva morreram no primeiro ano, devido a doenças.
Foi quando 91 desses nipônicos resolveram sair da área litorânea e se deslocaram para a Amazônia peruana, atraídos pelo ciclo da borracha e também devido o péssimo tratamento que eles recebiam nas fazendas inclusive com agressões e salários baixos, o que motivou ainda mais para eles se aventurarem e tentarem uma vida melhor no Oriente peruano.
Ao atravessarem a Cordilheira dos Andes os japoneses chegaram à região amazônica, precisamente ao Departamento de Madre de Dios, se fixando eles ao redor da cidade de Puerto Maldonado( próximo da fronteira com o Brasil)onde deram origem a uma atuante colônia que existe no local até os dias de hoje. Passaram eles ali a trabalhar na agricultura, comércio de estivas e exploração da borracha, sendo que depois chegaram no local outras levas de imigrantes compatriotas. Contudo vários deles resolveram se aventurar pelo Brasil, pois a notícia de que havia grande circulação de dinheiro nas cidades de Belém e Manaus, advindo da exploração gomífera, lhe chegaram aos ouvidos.
Sendo assim, os nipônicos saíram do Peru e desceram até a Bolívia, atravessaram os rios Guaporé e Mamoré e chegaram à Vila de Guajará-Mirim, que hoje pertence à Rondônia, onde desde 1902 já se tem registros da presença de japoneses naquela localidade, sendo que um dos que viveram ali foi Shoichi Genba (que em 1922 migrou para Belém).Outros rumaram para o Acre e depois foram para a capital do Amazonas e, mais adiante, chegariam à capital do Pará.
Em Rondônia, além de Guajará-Mirim, outros japoneses se dirigiram, a partir de 1907,para trabalharem na construção da estrada de ferro Madeira- Mamoré.
No Acre o "Peru Kudari" mais conhecido foi Issao Furuno que chegou ao território em 1920 com 20 conterrâneos, vindos da cidade boliviana de Cobija. Daquele grupo somente Issao ficou em torrão acreano, se fixando na capital Rio Branco, enquanto os demais seguiram para o Amazonas e Pará ou voltaram para a Bolívia. Também havia no Acre, nesse período, o japonês Hiderijo Tanaka, que se tornou proprietário de um seringal chamado Amapá.
OS JAPONESES EM BELÉM E MANAUS E A CRISE DO CICLO ECONÔMICO DA BORRACHA
Em Manaus os japoneses se dedicaram ao comércio ambulante, pintor de paredes, construção civil,cozinheiro, etc.Como exemplo um japonês que colocou um anúncio num jornal de Manaus, em 1912,se oferecendo para trabalhar de cozinheiro em algum Restaurante ou Hotel da cidade.
Mas em 1909 aconteceu um crime em Manaus quando o alfaiate japonês Shimokaua Kunikuti matou acidentalmente, com um tiro de revólver, um amigo paraibano no quarto do hotel em que estavam hospedados.
Entre alguns dos"Peru Kudari"que residiam nessa época no Estado do Amazonas se tinha Masahiko Matsuhita, Temunaike Karano, Genzaku Ushida, Kazuma Takahashi, Kihachi Daian, Tanobo Morebe, Takeo Yamashita,Shiro Oka, Tadashi Yamashita, Shimokaua Kunikuti, Jusaku Fujita, Toshio Suwa, Oishi Yamane, Takeichi Yamane, entre outros. Inclusive vivia na capital amazonense um famoso japonês praticante e professor de artes marciais chamado Soishiro Satake, que não tinha imigrado do Peru.
Mas com a crise da queda do preço da borracha, a partir de 1913,e a falência de empresas locais na Amazônia peruana, os japoneses que trabalhavam nessas empresas acabaram sendo dispensados de seus serviços. Agora sem perspectivas uma parte deles decidiu ir para a Bolívia enquanto outros japoneses resolveram atravessar novamente a fronteira e ir para o Brasil, chegando primeiramente no Acre e logo em seguida navegando eles pelo rio Madeira e indo tentar a sorte na área amazonense e paraense pois para ali já haviam imigrado, anos antes, outros "Peru Kudari".
Talvez um outro motivo da ida deles do Acre e da zona que hoje é Rondônia para outros pontos da Amazônia, além da questão econômica, seja também o medo de contrair doenças tropicais que muitas vezes era fatal para o enfermo, pois no ano de 1919 se tem a notícia do falecimento de dois japoneses em Porto Velho devido eles terem contraído tais doenças: um chamava-se Mieno Natugui (empregado da empresa Madeira-Mamoré Company) e o outro, de nome desconhecido, faleceu de malária no hospital da Candelária.
Já em Belém se tem registros da presença dos primeiros "Peru Kudari" na cidade em 1916,se afirmando que o primeiro que se estabeleceu em definitivo no local foi Shosuke Takahashi. Porém alguns dos demais japoneses que residiam na capital do Pará eram o casal Ito Kawamoto e Kyohachi Kawamoto, Tadaji Iwanaga, Issamu Hongo, Ysuji Eguchi,Yoshisuke Nishihara e Shoichi Genba, além do lutador Mitsuyo Maeda (que diferente dos outros, não tinha vindo ao Brasil como um imigrante).Haviam em Belém, em 1926,oito famílias japonesas residindo na cidade.
Quando o embaixador japonês Hichita Tatsuke chegou à Belém do Pará, em abril de 1926,para tratar do início da imigração japonesa oficial para a Amazônia(que começaria três anos depois), uma comissão de japoneses moradores na capital paraense foi recepcionar o embaixador no porto, a bordo do navio a vapor "Affonso Pena", que eram na verdade os já mencionados "Peru Kudari" que haviam se estabelecido na cidade anos atrás.
CONCLUSÃO
Embora a imigração desses pioneiros nipônicos que saíram de solo peruano para se aventurar no Norte do Brasil tenha sido pequena, assim como não foi organizada por políticos ou companhias de trabalho, sua trajetória ficou registrada na história nortista pois vários deles se estabeleceram por algum tempo na região e depois migraram para outros estados do país, enquanto os restantes permaneceram e acabaram se fixando em definitivo na região amazônica.
Não se tem um número preciso, mas estima-se que cerca de 500 japoneses "Peru Kudari" chegaram à Amazônia brasileira desde os primeiros anos do século XX até a década de 1910.
A imigração japonesa para a Amazônia Brasileira começou oficialmente em 1929,patrocinada e organizada pelos governos dos estados do Norte do Brasil, quando chegam à região a primeira leva de nipônicos que se estabeleceram no Pará (Tomé-Açu) e no Amazonas (Maués e Parintins),introduzindo eles nesses estados o cultivo da pimenta-do-reino e da juta.
Mas, como bem explicam as fontes históricas, o pioneirismo de imigrantes do Japão em terras amazônicas de nossa nação coube mesmo aos que vieram do vizinho país andino, cuja imigração teve menos impacto na região com relação a que houve posteriormente.
Na imagem, se tem a representação de um grupo de "Peru Kudari" em alguma parte da Amazônia no início do século XX.
FONTES: Gaspar Vieira Neto, in. Jornal do Commercio, livro "70 anos de imigração japonesa na Amazônia ",de Yoshio Maruoka.